sábado, 15 de outubro de 2011

Lixo


Um filme de 90 minutos de duração apresenta o trabalho do artista plástico brasileiro Vik Muniz no maior lixão da América Latina, o Jardim Gramacho, em Duque de Caxias (RJ). É odocumentário Lixo extraordinário, que segundo Vik representa a vontade de um mestre da arte em “mudar a vida de um grupo de pessoas”. Pessoas que vivem no e do lixo, em sua concepção biológica e social. Pessoas que se encantam com o que encontram, retiram do lixo até o seu alimento e se consideram realizadas ao final do dia.
Do ponto de vista ecológico e social, porém, o que realmente o filme retrata? A falta de perspectiva de alteração desse quadro em que um homem consegue retirar de restos de materiais descartados pela sociedade, matéria-prima para uma obra estipulada em 100 mil dólares e outra usada na abertura de uma telenovela em horário nobre.
A declaração de Tião, presidente da associação dos catadores do Jardim Gramacho, deveria servir de norte para a solução do problema dos lixões, aterros ou qualquer outro processo de descarte: seu grupo comunitário não é catador de lixo mas sim de material reciclável. Lixo é o que não tem condições de ser aproveitado. Tudo o que eles recolhem, entretanto, é reaproveitável.
O que podemos aprender com esse comentário?
Em primeiro lugar, vamos pensar como usar as palavras de Tião num contexto político. Isso é fácil: basta criar uma lei que obrigue cada produtor de lixo a encontrar uma alternativa para reciclar os seus resíduos. Por produtor de lixo se entende as grandes indústrias, as universidades, os hospitais, as donas de casa ou o estudante na sua escola, por exemplo. Mas isso já foi feito… Você conhece a nova lei de resíduos?
Em 2 de agosto de 2010, foi sancionada pelo então Presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, a lei n.º 12305, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. O que ela determina? Tudo o que qualquer pessoa que se preocupa com o meio ambiente, a qualidade de vida e o futuro pensaria para resolver esse problema.
O objetivo dessa lei é citado no artigo 4.º:
 Art. 4o A Política Nacional de Resíduos Sólidos reúne o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos.
 Mas como realizar esse gerenciamento? O artigo 9.º indica a ordem de prioridade de ação:
1.º — Não geração: repensar o porquê de tanto lixo no mundo hoje. Por que tanta embalagem para um objeto que ocupa 1/5 do volume desta? Por que não voltar ao uso de garrafas retornáveis? Por que não usar sacolas do tipo “ecobags” (sacolas ecológicas)?
2.º — Redução: por que há tantos copinhos descartáveis sendo usados? Quanto papel é impresso nos escritórios e nas repartições públicas?
3.º — Reutilização: utilizar ecobags, reutilizar embalagens ou quem sabe aplicar os materiais descartados em objetos de arte como os que Vik Muniz apresentou ao mundo.
4.º — Reciclagem: a maioria das indústrias depende diretamente da matéria-prima para processar seu produto. Imagine o quanto poderia ser preservado sabendo que diminuiremos a retirada de recursos da natureza? A matéria-prima que foi utilizada no processo retorna à indústria através da reciclagem.
5.º — Tratamento de resíduos sólidos: para reutilizar ou reciclar um produto considerado como resto de produção (doméstica, industrial, etc.), há recursos tecnológicos adequados a todos os tipos de resíduos.
6.º — Disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos: reintrodução dos compostos originais na natureza, ou seja, reposição do material ao ciclo de vida biogeoquímico.
 Analisando esse artigo da lei, concluímos que se todos pensassem no meio ambiente antes de agir e depois atuassem pensando na qualidade de vida, a situação seria diferente daquela que temos hoje.
 A gestão dessas ações estaria sob a responsabilidade de quem?
Art. 25.  O poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações voltadas para assegurar a observância da Política Nacional de Resíduos Sólidos e das diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta Lei e em seu regulamento.
Ou seja, está nas mãos de todos nós.
Importante também é o que a lei proíbe. No art. 47, são descritas as formas proibidas de destinação ou disposição final de resíduos sólidos ou rejeitos, como lançamento em praias, no mar ou em quaisquer corpos hídricos e o lançamento in natura a céu aberto.
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Lixo in natura: problema ambiental e social.Foto:D’Arcy Norman. Licenciada pelo Creative Commons Atribuição 2.0 Genérica.
Já o art. 48 descreve que são proibidas, nas áreas de disposição final de resíduos ou rejeitos, a utilização dos rejeitos dispostos como alimentação, a catação, a criação de animais domésticos e a fixação de habitações temporárias ou permanentes.
Então, como vamos agir para alterar o atual quadro dos lixões e dos aterros sanitários? Como dissemos anteriormente, o problema não é só ecológico mas também social…
O poder público tem a função de fazer a lei ser cumprida. A população não pode alegar desconhecimento desta. A comunidade que vive em situações como a retratada no documentário Lixo extraordinário precisa de uma solução. 
Segundo as considerações finais da lei:
  • a elaboração de plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos entra em vigor 2 (dois) anos após a publicação desse instrumento legal;
  • a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos deverá ser implantada em até 4 (quatro) anos após a data de publicação da lei.
Lembrando: o regulamento em questão data de agosto de 2010…
Por isso está na hora de todos — políticos, empresários, profissionais em geral e comunidade — arregaçarem as mangas. Que tal se começássemos a:
  • construir mais usinas de reciclagem?
  • criar e divulgar novas tecnologias de ação?
  • fiscalizar e realizar o levantamento das áreas que não condizem com a lei?
 Duas frases do filme poderiam ser utilizadas como metas desse trabalho:
 Quando uma coisa se transforma em outra é um momento mágico…” (Vik Muniz) — Em quanto tempo essa magia se tornará realidade nos lixões?
“Não pode ter grandes dificuldades quando é grande a boa vontade.” (Nicolau Maquiavel, cuja obra um dos catadores declarou ter conhecido entre os resíduos do lixão.) — Ou seja, só falta a boa vontade.
No Brasil, há vários movimentos sociais com projetos públicos e particulares direcionados a esse tema, como o site lixo.com.brcriado como uma comunidade virtual e que discute a relação do homem com a produção e a destinação do seu lixo. Há também sites direcionados a técnicas de coleta como o Projeto Coleta Seletiva Solidária, do Instituto Estadual do Ambiente - UFRJ.
Veja a seguir o trailer do filme “Lixo extraordinário”.
Por Anna Thereza Santos Ferreira
Fonte: Blog de Biologia

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